segunda-feira, 27 de junho de 2016

Quem mandou?

Eu escrevi esse diálogo (?) algumas semanas atrás e resolvi postar só agora não sei porquê, mas é um estilo bem diferente dos quais eu posto aqui. Espero que gostem!

Pois paz sem voz, paz sem voz
Não é paz, é medo - O Rappa

JOÃO: Fui roubado!
CORO: Quem mandou usar esse relógio?
MARIA: Levei um tiro de bala de borracha!
CORO: Quem mandou ser militante?
FELIPE: Fui humilhado!
CORO: Quem mandou estar num bairro de branco?
LARA: Fui encoxada?
CORO: Quem mandou não estar no vagão feminino?
PEDRO: Fui espancado!
CORO: Quem mandou beijar um homem?
OSVALDO: Minha filha levou um tiro de bala perdida!
CORO: Quem mandou ir na favela?
LÚCIO: Sofri um arrastão!
CORO: Quem mandou ir na praia?
HELENA: Levei uma pedrada!
CORO: Quem mandou estar de alaká*?
FLÁVIA: Fui assediada!
CORO: Quem mandou estar com aquela saia?
ELISA: Minhas fotos vazaram!
CORO: Quem mandou tirar essas fotos?
CARLA: Fui estuprada!
CORO: Quem mandou estar sozinha àquela hora?

Quem mandou eu querer ser eu mesmo?
Quem mandou eu estar onde queria estar?
Usar o que queria usar?
Falar o que eu queria falar?
Beijar quem eu queria beijar?
Quem mandou me julgar?
Quem mandou me culpar?
Quem mandou?

Quem mandou nós falarmos mais alto?
Quem mandou nós nos pronunciarmos?
Quem mandou nós gritarmos?
Quem mandou, hein?
Quem mandou?

Se me der um tapa, eu brigo
Se me der um grito, não calo
Se mandar calar, mais eu falo - Gonzaguinha

*alaká: ou pano-da-costa, é um complemento da indumentária da mulher, mas, acima de tudo, é a marca do sentido religioso nas ações da mulher como iniciada ou dirigente de terreiros, no Brasil. [Se estiver errado me corrijam nos comentários, pf]

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