segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Sugiro logo aterrorizo

Como estamos na Semana do Terror, a postagem de hoje é sobre a construção de um terror eficiente.


Não vim te ensinar a escrever, mas vim falar sobre o assunto. A maioria das histórias de terror são criadas através da sugestão de algo pode dar errado, mas a intensão do narrador não é dizer diretamente: "Isso vai dar m****!", ele vai fazer você ser seduzido à loucura.
Filmes, livros, série e games causam essa sensação em nós para que a missão seja cumprida. Em "Resident Evil", você sente mais medo do ambiente, da iluminação e da trilha do que das criaturas assassinas. A franquia de games se vale de clichês do terror: mansões isoladas, áreas rurais, laboratórios. Mas não basta colocar uma mansão luxuosa abandonada, e dizer que isso é terror. Aí que entra a ambientação.

Ambientação é o ato situar o personagem num ambiente levando em consideração clima e descrições com detalhes que favoreçam o desenvolvimento da cena ou do livro. Em produções audiovisuais, o terror é mais ativo com uma câmera bem colocada, uma expressão do ator e com uma trilha sonora.
Quando se coloca uma trilha icônica ou, pior, quando se instala o silêncio, qualquer passo em falso é fatal. Ou seja, você já começa a tapar os olhos deixando uma fresta entre os dedos, afinal, você não quer perder a cena, ou você fica excitado com o "como? quando? onde?" da cena (uma com pouco mais psicopata).
Na literatura, isso é mais complicado. É muito difícil o leitor se encaixar no ambiente narrado. Vou pegar dois exemplos.

"A porta dava para um corredor estreito, mal iluminado por instalações elétricas antigas [...]
Enrugou o nariz, franzindo as sobrancelhas. Havia um odor vago no ar, um cheiro fraco de alguma coisa desagradável [...] Bruum
Chris ouviu um som leve e arrastado atrás da porta à direita, como um punho deslizando pela parede. Alguém estava do outro."

S, D. Perry demora para constatar que alguém estava do outro lado do corredor, e demora mais ainda para dizer que aquele alguém era um zumbi em "Resident Evil: Conspiração Umbrella". Essa é a essência de um thriller (que pode ser traduzido como suspense).
Em "Sonho Febril", George R. R. Martin trabalha muito bem nessa ideia de ambientar o livro e não uma cena. Veja a descrição:

"E, conforme o sol descia, a água barrenta ia assumindo um tom avermelhado, um tom que ficava mais intenso, espalhando-se e escurecendo até dar a impressão de o Fevre Dream se movia por um ria de sangue. Então o sol sumiu por trás das árvores e das nuvens, aos poucos o sangue escureceu, ficando marrom como sangue seco, e, por fim, preto como um túmulo."

Para quem não sabe, "Sonho Febril" é um livro sobre vampiros, ou como queira chamar, em um rio, o Mississippi, no séc. XIX. O livro segue um clima às vezes sádico e muitas vezes tenso, com muitas descrições que faz o leitor ficar apreensivo.
O terror tem uma linha tênue entre o pastelão e o amedrontador. Tudo em um livro de terror que atrair: o clima tem que ser apático, o vilão tem que ser sádico para os acontecimentos serem repugnantes, as vítimas tem que ser desinformadas...
Então lembre-se de MIchael Jackson e sua ambientação perfeita de um clipe que até poucos anos atrás eu morria de medo.

"You hear the door slam [Você ouve a porta bater]
And realize there's nowhere left to run [E percebe que não há para onde correr]
You feel the cold hand [Você sente a mão fria]
And wonder if you'll ever see the sun [E gostaria de saber se um dia você verá o sol]
You close your eyes [Você fecha os olhos]
And hope that this is just imagination [E espera que isso seja só imaginação]
But all the while [Mas enquanto isso]
You hear a creature creepin' up behind [Você ouve uma criatura rastejando por trás]
You're outta time [Você está sem tempo]"

Porque isso é terror!
Até segunda com uma possível resenha de "Sonho Febril".

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